Alguns sinais já vinham azedando o humor do investidor em relação ao comprometimento do governo brasileiro com o equílibrio das contas públicas. Mas a sexta-feira (11) sepultou o apetite a risco, consolidado pelas falas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que trouxe de volta à pauta uma promessa de campanha que prevê mais renúncia fiscal.
Em linha com outros discursos do passado, Lula defendeu a proposta das eleições de 2022 de isentar o imposto de renda para trabalhadores que ganham até R$ 5 mil. Para completar, o petista sinalizou ainda que a compensação possa vir do bolso de investidores em ações, sinalizando o fim da isenção de imposto dos dividendos.
- O Ibovespa caiu 0,28%, aos 129.992 pontos, encerrando a semana com recuo de 1,37%. No mês, o prejuízo já é de 1,38%. Enquanto isso, a queda no acumulado do ano chega passa de 3,12%.
- O giro financeiro foi, mais uma vez, fraco, alcançando R$ 12 bilhões durante as negociações. O volume ficou abaixo da média diária dos últimos 12 meses, de R$ 16,6 bilhões.
“A fala acabou gerando um mal estar e pessimismo no mercado hoje com bolsa caindo, dólar subindo, além de estresse nos juros futuros, que já vinham subindo após dados de inflação um pouco acima do esperado”, afirma Fabio Louzada, economista, planejador financeiro e fundador da Eu me banco.
Diante desses ruídos, o Ibovespa ficou de fora da festa no exterior. Tanto nos índices europeus quantos em Nova York, a semana foi de alta. Não deu para surfar na onda de bom humor trazido pela inflação ao produtor (PMI, na sigla em inglês) nos Estados Unidos.
O indicador veio um pouco mais fraco, fortalecendo a tese de que o corte em novembro deve ser mantido, na casa de 0,25 ponto percentual. O S&P 500 encerrou a quinta semana consecutiva em alta, após alcançar mais um recorde nos últimos dias.
- O dólar acumulou alta de 2,92% esta semana, negociado a R$ 5,61 no fim da sessão de sexta, após valorização de 0,50% ante o real. Em outubro, a moeda sobe 3,08%.
Outro fator de forte influência no câmbio é o preços das commodities. Apesar das idas e vindas, tanto as empresas ligadas ao petróleo quanto aquelas que vendem minério de ferro e aço encerram a semana em queda. Quando as commodities caem, também diminui o fluxo de dinheiro estrangeiro nos países emergentes que exportam esses produtos. Isso torna a moeda americana mais escassa por aqui e, portanto, mais valiosa.
Sem a ajuda da Petrobras e outras empresas do setor, o Ibovespa não resistiu às pressões internas. Nem mesmo a Vale, que subiu e impediu uma tragédia maior no índice foi capaz de anular os efeitos negativos dos comentários do presidente. A perspectiva de contas em déficit eleva a percepção de risco sobre o país, o que faz com que os juros subam e desencoragem investimentos na renda variável.
O próprio Banco Central (BC) já frisou diversas vezes, em atas e comunicados, que o risco fiscal prejudica a busca por taxas mais baixas. Isso significa que, além da inflação em tendência de alta, este outro ponto importante para a autoridade monetária indica que mais juros estão por vir.
Sempre na tentativa de se antecipar, o mercado já vê a Selic muito acima dos 12% que se imaginava até uns dias atrás. Os juros futuros reagiram de acordo com esses temores, subindo em toda a curva, desde os contratos mais curtos até os mais longos.
- A Taxa de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2025 teve a menor variação do dia, passando de 11,11 para 11,13% ao ano de ontem para hoje. Prêmios em contratos de curto prazo estão mais ligados às expectativas de investidores para a Selic;
- No médio prazo, houve oscilação de quase 1% nos retornos da taxa para janeiro de 2029, que passou de 12,63% para 12,74%;
- Já para janeiro de 2034, a taxa subiu de 12,38% para 12,58%. Vencimentos com prazos mais longos refletem uma maior a preocupação com calote do governo.
O avanço mais acentuado dos contratos futuros de longo prazo evidencia o efeito da desconfiança em relação ao comprometimento fiscal do governo. O mercado tem se mostrado bastante sensível a qualquer notícia que possa envolver mais gastos, mesmo que venham acompanhadas com algum tipo de dispositivo de compensação.
Apesar dos esforços do ministério da Fazenda, a lógica por trás das contas públicos continua sendo criticada pelo mercado, que quer ver menos gastos em vez de mais impostos para compensar as despesas.
Empresas
Na semana, 71 das 86 ações do Ibovespa registraram perdas. Todos os setores foram afetados, alguns com menos intesidade que outros.
Entre as quedas, se destacam empresas que sofrem com a alta nos juros futuros como as construtoras MRV, Cury e Eztec. No setor de varejistas, recuaram com força os papéis de empresas como Assaí e Carrefour.
“Já entre as altas, além de Vale, que surfa na alta do minério de ferro, temos Lojas Renner, que se beneficiou com nova recomendação do J.P. Mogan”, afirma Louzada. O banco americano elevou a recomendação do papel de neutra para compra.
Próximos dias
De acordo com Mariana Conegero, especialista em mercado de capitais e sócia da The Hill Capital, na semana que vem, o foco dos investidores estará nos próximos passos do Banco Central dos Estados Unidos (Federal Reserve). Eles estarão atentos aos discursos de seus membros, que podem sinalizar a direção da política monetária.
“Além disso, a temporada de balanços do 3º trimestre continuará, com grandes empresas apresentando seus resultados, o que promete trazer volatilidade aos mercados, especialmente nos EUA e Brasil”, completa.
No cenário local, as discussões fiscais continuarão a pesar no mercado, especialmente com a possível revisão do plano de negócios da Petrobras, que já impactou o humor dos investidores.
Com Valor Investe.