Com o desemprego a pino, a recessão na espreita, a Educação em frangalhos, o Congresso convulsionado e o país dividido. Com tudo isso, Jair Bolsonaro conserva o otimismo.
Numa entrevista para argentino ver, o capitão disse para o jornal La Nación algo que vem repetindo com uma insistência própria dos que têm fé: “Eu tenho uma missão de Deus, vejo dessa maneira. Foi um milagre estar vivo e outro milagre ter ganho as eleições. Deus também tem me ajudado muito na escolha dos meus ministros.”
A qualidade do ministério indica que Deus, embora ainda seja onipresente e onipotente, já não é full time. Mas o que importa é que Ele está no meio de nós. E Bolsonaro se dispõe a ajudá-lo. No momento, está empenhado em pacificar o país: “Sim, estou fazendo esforços. Não estou atacando nem buscando a divisão.” A coisa poderia estar melhor. “Mas há gente que não gosta de mim mesmo sem me conhecer.”
Às claras, apenas o PSL e o Partido Novo apoiam o governo. Mas Bolsonaro, guiado por forças celestiais, enxerga uma maioria que os olhos não vêem: “Fui 28 anos deputado e nunca pedi cargos em troca de nada. Eu acompanhei tudo o que se passou, sem me envolver. Mudamos a maneira que o Executivo se relacionava com o Legislativo. E a maioria dos parlamentares apoia isso.” Aleluia!
Por mal dos pecados, os entrevistadores argentinos não suprimiram de sua pauta perguntas sobre Flávio Bolsonaro, o primogênito do ungido. “Se fez algo mau, tem que pagar”, disse o comissionado de Deus, antes de renovar sua crença: “Tenho confiança que ele não fez nada de mau.” E quanto ao Fabrício Queiroz? “Pelas coisas que tenho ouvido dele… Ele tem que se explicar. Tem que ser ouvido.”
Em verdade, Queiroz já foi ouvido. Ou lido, pois só concordou em “falar” com o Ministério Público por escrito. Não disse coisas edificantes. Admitiu que se apropriou de nacos dos contracheques dos assessores do gabinete de Flávio Bolsonaro. Mas teve pelo Zero Um uma consideração inaudita. Declarou que o filho do seu velho amigo não sabia de nada.
Embora já não confie em Queiroz, Bolsonaro acredita 100% no pedaço da versão dele que se refere à inapetência do filho para controlar o que se passava no seu próprio gabinete de deputado estadual. “Agora, por que interessa atacar meu filho?, pergunta o presidente. Porque “me desgasta”, ele mesmo responde. “Não há dúvidas de que me desgasta.”
A análise é da coluna de Josias de Souza desta segunda-feira (3), do portal UOL.