A Crusoé trouxe esta semana um depoimento de quase quatro horas em vídeo de Marcelo Odebrecht e cópias de emails trocados entre ele e executivos da Odebrecht encarregados de cooptar políticos e personagens do governo. O delator da Lava Jato foi ouvido pela Procuradoria-Geral da República sobre um tema bastante polêmico e que, inclusive, na época rendeu até censura pelo Supremo Tribunal Federal: os arquivos relacionados a Dias Toffoli.
O relato dos jornalistas Rodrigo Rangel e Luiz Vassalo é uma sequência da matéria “O amigo do amigo de meu pai”, censurada em abril de 2019, no âmbito do inquérito do fim do mundo. Eles tiveram acesso à integra da apuração da Procuradoria-Geral da República sobre a relação de Toffoli não apenas com a Odebrecht, mas com a OAS. Confira um trecho:
“Em abril do ano passado, uma reportagem de Crusoé revelou o teor de um documento de nove páginas enviado por Marcelo Odebrecht à Operação Lava Jato. Respondendo a dúvidas dos investigadores surgidas durante a análise de uma leva de e-mails até então inéditos trocados por ele com outros executivos da companhia, o empreiteiro-delator revelava a identidade de um personagem ao qual se referia como “o amigo do amigo de meu pai”. Era José Antonio Dias Toffoli, hoje ministro do Supremo Tribunal Federal, que à altura da troca de mensagens ocupava o posto de advogado-geral da União. “Afinal vocês fecharam com o amigo do amigo de meu pai?”, perguntou Marcelo a dois altos executivos da empreiteira. “Em curso”, respondeu Adriano Sá de Seixas Maia, um dos chefes da área jurídica do grupo. Os investigadores queriam saber quem era o misterioso personagem e qual era a tratativa em curso. Além de revelar que se referia a Toffoli, Marcelo Odebrecht contou que a conversa se referia a “tratativas que Adriano Maia tinha com a AGU sobre temas envolvendo as hidrelétricas do rio Madeira”.
A reportagem acabou censurada por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. Atendendo a um pedido feito por Dias Toffoli por meio de uma mensagem de texto, ele ordenou que o texto fosse retirado do ar. A decisão foi expedida nos autos do rumoroso inquérito do fim do mundo, que investiga fake news, ameaças e ofensas à corte. Em seu despacho, Moraes chegou a sustentar que se tratava de uma notícia falsa. Era um falso argumento, obviamente. A insólita ordem de censura expedida sob o timbre de um tribunal cuja missão principal é zelar pelo bom cumprimento da Constituição, que protege a liberdade de imprensa e a liberdade de expressão, ganhou contornos de escândalo. Dias depois, ao se dar conta de que, sim, o documento publicado por Crusoé existia, e de que não havia qualquer excesso na reportagem, Moraes revogou a decisão.