O final de semana foi de festa e injeção de ânimo para o presidente Jair Bolsonaro. Atos de eleitores mais fieis e radicais em dezenas de cidades celebraram seu Governo e chegaram a reforçar a proposta de intervenção militar para que ele possa governar ir contra os Estados que determinaram o confinamento. São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília tiveram os atos mais vultosos, com eleitores de verde e amarelo ocupando alguns quarteirões da avenida Paulista e em Copacabana, respectivamente, além de uma carreata barulhenta na capital. Todos em apoio a um segundo mandato de Bolsonaro e com cartazes cobrando eleições em cédulas de papel, em lugar da urna eletrônica.
É com esse ar de “já ganhou” que Bolsonaro começa a primeira semana de maio, mas encontra um iceberg no caminho. A CPI da Covid do Senado começará a interrogar os três ex-ministros da Saúde de Bolsonaro, incluindo Henrique Mandetta, eventual opositor do mandatário em 2022. Também o atual titular da pasta, Marcelo Queiroga, está previsto na agenda. A oposição se articula para cobrar reunir provas das responsabilidades do presidente na crise sanitária. Os líderes do Governo no Congresso, Eduardo Gomes, e no Senado, Fernando Bezerra, terão o papel de amenizar a ofensiva. Gomes e Bezerra não são membros do colegiado, mas qualquer senador pode participar das reuniões presencialmente ou pelo sistema remoto. No meio de tudo, está o MDB, que está com um pé em cada canoa. Os dois senadores emedebistas titulares da Comissão Parlamentar de Inquérito, Renan Calheiros e Eduardo Braga, atuarão em sintonia com os antagonistas do Planalto neste momento.
A articulação dos opositores envolve o principal líder da esquerda brasileira, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que desembarcará em Brasília para reunião com parlamentares e articuladores de várias legendas. Depois de receber as duas doses da vacina contra a covid-19, Lula quer intensificar a estratégia não só para disputar a presidência no ano que vem, mas principalmente para antagonizar com Bolsonaro desde já. Na relação de reuniões do petista, também estão encontros com representantes de embaixadas estrangeiras, como o representante da Rússia, para tratar da vacina Sputnik V, recentemente vetada pela Agência Nacional de Vigilância em Saúde (Anvisa) por conta da omissão de documentos necessários para a sua aprovação no Brasil.
No Senado, o objetivo é mostrar que quem coordenou o enfrentamento da pandemia foi o próprio presidente, e não seus ministros da Saúde. Na sessão desta terça-feira, quando serão ouvidos os ex-ministros Mandetta e Nelson Teich, a bancada opositora espera comprovar que, por serem médicos, os dois se contrapuseram ao negacionismo de Bolsonaro. Ambos defenderam o alinhamento à ciência e foram contra recomendar tratamentos ineficazes contra a covid-19, como o uso da cloroquina. A oposição quer mostrar como os dois ex-ministros fracassaram no intento de convencer o presidente a adotar medidas de isolamento social e que sem respaldo do Palácio do Planalto nem autonomia, os dois desembarcaram do Governo.
Na quarta, é a vez do ex-ministro e general da ativa Eduardo Pazuello comparecer à CPI. O desafio será mostrar que o presidente o convenceu a assinar a recomendação de indicação do uso da cloroquina. Outra tentativa é ouvi-lo sobre o processo atravancado de negociação com o Instituto Butantan para a aquisição de vacinas e obter detalhes sobre a oferta feita pela farmacêutica Pfizer para a compra de 70 milhões de imunizantes a serem entregues em dezembro do ano passado. Os senadores deverão explorar, principalmente, o episódio em que Bolsonaro fez uma transmissão ao vivo com Pazuello na qual o presidente desautorizou o general e afirmou que o seu Governo não compraria a vacina do Butantan. Na ocasião, o então ministro resumiu o encontro da seguinte maneira: “É simples assim, um manda, o outro obedece”.
Na atual circunstância, o depoimento de Pazuello é o que mais preocupa o Planalto. O general não costuma agir com calma quando pressionado. Investigado pelo Ministério Público Federal, sem a prerrogativa de foro privilegiado e correndo o risco de ser preso por conta da omissão de sua gestão no caos sanitários de Manaus no início do ano, o Governo teme que o general tente retirar de si qualquer responsabilidade e disparar sua artilharia contra o presidente. O jornal O Globo noticiou neste domingo que Pazuello esteve no Palácio do Planalto no sábado onde se preparou para enfrentar as perguntas da CPI.
Já na quinta-feira, a ideia é mostrar que o atual ministro, o médico Marcelo Queiroga, apenas seguirá a cartilha do presidente. Também tentarão explorar o fato de que o cronograma para a vacinação da população não está bem definido, já que sofre alterações constantes. Por exemplo, inicialmente, havia a expectativa que a população prioritária fosse toda vacinada até junho. Esse prazo foi ampliado para setembro.