Um dos políticos mais experientes do atual Congresso, o senador Romero Jucá (MDB-RR) não se arrisca a traçar um prognóstico sobre o juiz Sérgio Moro como ministro da Justiça. “Não temos que ter preconceito”. O emedebista, que já foi apontado como articulador de uma reação política à Lava Jato após ter conversa vazada na qual falava sobre um suposto “acordo nacional” para conter a “sangria”, afirma não temer uma “caça às bruxas” no futuro governo de Jair Bolsonaro. “As bruxas já são as bruxas, não são reconhecidas no mundo real. O governo vai ter que cuidar do mundo real.”
Sem mandato pela primeira vez em 25 anos, Jucá diz que não é hora de parar. “A política está no meu sangue, acho que sei fazer isso bem”, afirmou ao Estado o político que foi líder do governo no Senado dos últimos quatro presidentes e ministro de dois deles.
Como avalia a indicação do juiz Sérgio Moro para o governo Bolsonaro?
Bolsonaro assume no contexto de ter sido depositário de ódios, de revoltas, de tudo isso que se conceituou como culpar a política pela situação individual de cada pessoa. Ele assume com esse tipo de cobrança latente, com a cobrança do que pregou. Não sou daqueles que critica a escolha do Moro, nós temos que respeitar. Não temos que ter condenação prévia de ninguém, não temos que ter preconceito. A posição do MDB (em relação ao governo Bolsonaro) é uma posição de independência, é diferente da neutralidade que tivemos no primeiro turno. Neutralidade é você liberar e não se manifestar. Independência é você avaliar e se posicionar a cada questão política que teremos no Brasil.
Críticos da Lava Jato sempre disseram que intenção era destruir os políticos para ocupar a política. A escolha do Moro é uma confirmação disso?
Em si só, não. Vamos ter que esperar as ações. Acho que o Moro tem todo o direito de ir para o Ministério. O Moro só não é a Operação Lava Jato, é um segmento importante. Ele simboliza (a Lava Jato), eu acho que ele (Bolsonaro) deve ter pesado muito isso.
Ele vai ter que aprender a ser político?
Todo mundo é político. Ele fazia política. Ele fez política com a imprensa, fez política com o mundo Judiciário, com a sociedade, ele fez política. Não é uma novidade para ele fazer política. Só que o tipo de política que ele vai fazer vai ser ampliado, algumas vertentes que ele não atuava, ele vai ter que atuar. Se ele atuou bem em todas essas situações que ele viveu…é uma pessoa inteligente, tenho certeza que ele poderá fazer um bom trabalho.
Com essas nomeações, Bolsonaro começa com uma expectativa alta em relação ao seu governo?
Começa alta porque, apesar de ele não ter verbalizado certas coisas, o contexto no qual a campanha dele se colocou está impregnado na sociedade. As pessoas vão querer melhorar de vida. Cobrança será alta, ele vai ter que administrar isso.
Partidos tradicionais, como DEM e PSDB, estão se renovando, com novas lideranças surgindo. O MDB fará o mesmo?
No MDB já começamos a fazer a guinada. Quando tiramos “partido” (da sigla PMDB) e colocamos o nome “movimento”, não era para voltar ao passado e esconder problemas do presente. Era porque reconheço que a ação política hoje não é mais algo burocrático. Tem que estar num movimento. O MDB já foi um movimento e tem que voltar a ser. Sempre tivemos atrelados a governos, com muito menos liberdade de fazer uma política mais abrangente. Esse é um momento novo que nós vamos construir, mas não precisa mudar as pessoas. Nenhum partido mudou pessoas. Você pode ter mais jovens, mais novos, mas é quem estava nesse jogo há muito tempo. Não é fácil porque o MDB é um partido antigo, é o que está mais tempo aí. Vamos ter uma tarefa pela frente, não é fácil mudar, mas temos que caminhar porque o processo político eleitoral será outro a partir de agora.
Políticos mais experientes do MDB vão saber fazer política sem estarem próximos a cargo e a governo?
A necessidade ensina. Você não pode ficar preso ao modelo que foi completamente reformulado. Quem insistir nisso, está fora do jogo. Esse modelo é um modelo que não se sustenta mais.
O senhor dizia, em 2014, que se candidataria apenas mais uma vez, em 2018. Após este resultado, o senhor vai deixar a política?
A política está no meu sangue, eu sei fazer isso bem. Eu não ter mandato não quer dizer que eu não possa debater, participar. Se eu vou ser candidato daqui quatro anos, vai depender da conjuntura, da minha condição de vida. É uma avaliação para ser feita no momento. Não está nos meus planos. Vou cuidar da minha vida, eu sobrevivo do meu trabalho, não tenho posses.
Como o senhor avalia que deve ser a relação do PSL com o Centrão?
Você não precisa ignorar outras forças do Congresso. Se fizer isso, é algo perigoso. O processo ali na Câmara é muito complexo e muito amarrado. Precisa de todo mundo para os processos andarem. Acho que o governo Bolsonaro vai ter gente experiente para verificar na prática o que precisa ser feito. O MDB não estará no Centrão. Acho que não é uma boa prática para o futuro do MDB ficar caudatário do Centrão.
O Paulo Guedes é visto por parte dos agentes financeiros e da academia como alguém extremo. O senhor acha que ele vai conciliar todos os lados?
A prática do Paulo Guedes só vai ser vista agora. A teoria do Paulo Guedes pode até ser vista com algum pano de fundo, mas a prática dele é que vai contar, não a teoria. Nós não vimos a prática dele ainda, temos que dar o benefício da dúvida, não dá para condenar. Nunca sentei com o Bolsonaro para conversar, também não tenho como avaliar a pessoa dele. Você pode radicalizar para ganhar uma campanha, mas você não pode radicalizar para governar. No governo, você governa para todos. E o País saiu dividido.
Então Bolsonaro precisa fazer um ajuste de tom?
É o que eu faria se fosse presidente.
Nessa radicalização da campanha, ele também fez da bandeira dele o combate à corrupção. O senhor teme algum tipo de caça às bruxas a partir do ano que vem?
Eles é que têm que falar. O governo não pode perder tempo com caça às bruxas porque as cobranças virão. As bruxas já são as bruxas, não são reconhecidas no mundo real. O governo vai ter que cuidar do mundo real, principalmente. Estadão Política.