De volta à coordenação do Centro de Contingência de Coronavírus, no governo de São Paulo, o infectologista David Uip, de 67 anos, foi aplaudido na entrevista coletiva de ontem no Palácio dos Bandeirantes após um depoimento emocionado sobre as angústias e incertezas vividas desde o teste positivo para Covid-19, no dia 23 de março. Mais tarde, em conversa por telefone com O GLOBO, ele se diz aliviado e recuperado quase 100%, mas admite: “Juntando preocupação e doença, nunca tive algo igual”.
Uip descreve ter sentido muita dor no corpo e cansaço — além de medo. O pior dia, conta, foi o domingo véspera do exame:
— Eu me senti muito mal. Foi difícil. Coronavírus não é brincadeira. E tive medo, claro. Mas muita fé. Do tipo: “Tenho mais coisa para fazer. Não acaba aqui”.
A fé, diz, foi determinante na recuperação (“E sempre tive, não surgiu agora”). Também conta que não chegou a ter gravidade clínica ou necessidade de internação que o levasse a imaginar um desfecho trágico. Mas diz que havia “expectativa enorme”, até porque, como um dos maiores especialistas em doenças infecciosas no país, sabia da evolução da patologia.
— Obviamente, conhecia detalhes da doença. Então, sabia quando podia complicar, e foi batendo tudo. Outro componente não dá para excluir: o emocional é importante. Consegui ficar em casa sem ser internado, mas é um processo sério. Se me perguntar se já tive algo igual, juntando preocupação e doença, não — afirma.
A exaustão, diz, marcou o período mais difícil.
— No domingo retrasado trabalhei, passei visita e, no final do dia, o governador me chamou para ir ao Hospital das Clínicas, onde iam mostrar os novos leitos de UTI. Depois teve uma entrevista no Palácio para um canal de TV. Mas não conseguia ficar em pé. Fui para casa, tomei banho, e nessa noite para segunda passei mal. Um cansaço estarrecedor e febre. De manhã, comecei a tossir — lembra.
Nesse dia, 23, foi ao Hospital Sírio-Libanês, onde fez o exame para coronavírus — positivo — e uma tomografia, de resultado normal.
— Fiquei com febre e tosse vários dias, até que na segunda seguinte fiz uma nova tomografia, que mostrou uma pneumonia. Só melhorei mesmo na última quarta-feira — diz. — É uma dor no corpo. Perdi totalmente o olfato e o paladar. Meu olfato só voltou ontem.
O Globo